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Você dormiu comigo ontem?

Autor: Julio Sampaio

          Nossa comunicação anda excessivamente direta. Você recebe um whats de alguém com quem não fala há anos e ele ou ela engata uma pergunta ou um pedido, como se vocês tivessem no meio de uma conversa. Dado o recado, pronto. Fim de papo, sem necessidade de maiores delongas. Algumas vezes, esta mensagem é também imperativa, do tipo, “me envie o material até dia tal” ou “reunião amanhã às x horas, não deixe de comparecer”. Não estou falando de um comando hierárquico entre chefe e subordinado, num estilo autoritário, mas de uma relação entre iguais.  

          A informalidade da mensagem instantânea trouxe junto esta mudança cultural. Estamos mais diretos na comunicação. Não é uma característica de nosso povo, tradicionalmente, mais jeitoso na maneira de se relacionar. Os orientais, por exemplo, são fortemente indiretos, o que os torna mais cuidadosos e sensíveis, ao contrário dos americanos, que costumam ser mais objetivos, pragmáticos. Ambos convivem bem entre si, com o seu jeito de ser. E nós, o que ganhamos e o que perdemos? 

          Ganhamos tempo, dirão alguns. Outros poderão falar em objetividade, transparência e até produtividade. Pode ser verdade, mas estamos deixando de lado o belo nas relações, a gentileza. O belo da arte, o belo na culinária, o belo na decoração, o belo na degustação de um bom vinho ou o belo de qualquer trabalho, o belo está sempre nos detalhes. “Tudo que merece ser feito, merece ser bem-feito”, dizia meu velho pai com frequência. “A pressa é inimiga da perfeição” ou “o apressado come cru”, diz a sabedoria popular. 

          Já que estamos no campo das frases, caro leitor, que tal: “você dormiu comigo ontem?”. Era o que se dizia a alguém quando chegava e não dava nem bom dia. Será que a pessoa com quem dormimos não merece um bom dia? Casais se acostumam a relações ásperas em que não há nem o bom dia, o boa noite, um beijo de despedida de manhã ou de chegada à noite. Se acostumam a não tratar bem um ao outro. Em nome da informalidade, destroem o belo da relação, que um dia foi entre pessoas apaixonadas e cuidadosas. 

          Ouvi de uma cliente uma vez que o seu casamento ia mal. Embora se gostassem, não estavam felizes. Suas reflexões a levaram a concluir que adquiriram maus hábitos na maneira de se relacionar. Nada aparentemente grave. Não se ofendiam um ao outro, mas em algum momento, ficou pelo caminho o tempero. Deixaram de lado a gentileza. 

          A mesma situação se aplica a uma equipe de trabalho. O convívio frequente não pode ser pretexto para a ausência de um olá, bom dia, boa noite, até logo, por favor, obrigado, ou pequenos gestos de gentileza que, na verdade, não tomam quase nenhum tempo e valorizam as pessoas. 

          A gentileza está nos detalhes e abandoná-la, em nome da objetividade, não é uma boa escolha. Gostamos de ser bem tratados e isto significa que precisamos tratar bem. Tudo pode ser feito em nível superior. Nos níveis mais altos estão a gentileza, a qualidade e a felicidade. 

          Voltando ao início de nossa conversa, caro leitor, peço desculpas por ter sido tão direto. Não, você não dormiu comigo ontem e a pergunta pode ter sido direta demais, talvez até ofensiva. Se você chegou até aqui, muito obrigado. Desejo que você tenha uma ótima semana, com muita gentileza.

Julio Sampaio (PCC, ICF)

Idealizador do MCI – Mentoring Coaching Institute

Diretor da Resultado Consultoria, Mentoring e Coaching

Autor do Livro: Felicidade, Pessoas e Empresas (Editora Ponto Vital), dentre outros