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O recado das deusas sobre felicidade

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Ela não era um bom exemplo, mas era uma boa pessoa, como ela mesma se definia. Era também uma grande artista. Uma das maiores. Suas músicas marcaram gerações e estão entre os grandes hits. Bateu diferentes recordes, como o de compositora mais censurada da ditadura, não porque ameaçasse o governo de então, mas porque colocava em xeque os chamados bons costumes. Fez rock, quando somente os homens estavam autorizados a fazer, como disse certa vez, com os seus óvulos e útero. Fez tudo que quis. Era corajosa mesmo nas viagens de fuga da realidade. Pagou o preço por cada loucura. Esteve nos céus e nos infernos. Suas duas autobiografias são como ela mesma, fortes, criativas, irreverentes e únicas. Textos brilhantes. No meio de irônicas metáforas, com sutileza ou não, dinamite nos falsos moralismos. As mais belas palavras, seguidas das mais chulas. Não fosse assim, não seria a jovem velha Rita, deusa do rock. São dela as palavras abaixo.

“Ficar velho é um sentimento de missão cumprida e comprida. Sei que estou mais perto da morte que jamais estive, mas não sinto o meu coração apertar de medo. Sei que vou deixar meu corpo físico e partir para o desconhecido do qual não tenho medo...A morte deve ser o grande gozo final da vida; aonde quer que eu vá, lá estarei eu”.

Tia Rita está lá, onde quer que seja. Está vivendo o seu presente, como sempre o fez. “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”, disse Caetano. Mas é preciso estar presente na sua própria vida, o que também deve valer para depois dela.

Convido para esta conversa a Wendy Mitchel, um outro tipo de deusa. Ela convive com demência desde 2014. Tinha uma vida comum até que a demência a alcançou aos 41 anos. Hoje, vive um propósito maior do que ela mesma. Mora sozinha, é palestrante internacional, luta pelos portadores do mesmo mal e escreveu dois livros depois de diagnosticada a doença: Alguém que eu costumava conhecer e O que eu gostaria que as pessoas soubessem sobre a demência. São livros humanos, que trazem a voz de pessoas humanas que, frequentemente, são tratadas com impaciência ou como se já não estivessem aqui. Sem julgamentos. Sabemos o quanto é difícil para quem está por perto também. Meu pai teve Alzheimer e sei o quanto foi duro para a minha mãe, sempre do seu lado, cumprindo o “até que a morte os separe”.

 Neste momento, o que quero é trazer de Wendy é uma de suas reflexões sobre felicidade. “A felicidade para mim e muitos dos meus amigos, envolve a atenção plena e a apreciação do momento presente, porque o passado frequentemente é um borrão e o futuro é incerto. Entretanto será que algo realmente mudou? Não deveríamos todos viver no presente”?

Presença é um dos quesitos para a felicidade. É difícil estar presente. Enquanto escrevo sou interrompido pelas mensagens que não param de chegar. Elas vêm como que a gritar que são urgentes. Não são. Elas podem esperar, mas eu preciso convencer a minha mente disso.

A felicidade só pode ser desfrutada no presente. É a própria Wendy quem complementa: “ao crescermos perdemos o hábito de focar uma coisa de cada vez e deixamos que o desejo por outras, estrague o que estamos vivendo no momento. Mais do que tudo, a demência me ensinou que precisamos retornar ao agora”.

Wendy e Rita, duas jovens deusas, vivendo hoje em planos diferentes. Ambas nos lembram uma verdade que já sabemos. Não é hora de nos prender ao passado e o futuro será sempre futuro. Somos felizes, ou não, unicamente no presente. Estando presentes no presente. É simples, embora não seja fácil. Vale para os mortais como eu e você. Vale para as deusas, roqueiras ou não.

 

 

Julio Sampaio (PCC, ICF)

Mentor do MCI – Mentoring Coaching Institute

Diretor da Resultado Consultoria, Mentoring e Coaching