No último artigo, compartilhei a lenda da Cidade de Cristal, cujo Rei Gransábio I deixou para seu filho Iuvenis o enigma do segredo que o ajudou a criar felicidade e prosperidade para o seu reino, ao mesmo tempo em que outras civilizações, como Atlântida, sucumbiram. A resposta do enigma, mesmo hoje, não parece tão simples de compreensão: o que vemos nos outros e à nossa volta, seja bom ou ruim, é espelho do que existe dentro de nós.
Acreditamos firmemente no que vemos. É bíblica a expressão “ver para crer” e até os nossos dias não havia nada em que poderíamos confiar mais do naquilo que víamos. Bom, hoje temos a inteligência artificial que poderá modificar isto, mas ainda não ocorreu. Aliás, outra expressão antiga que ainda é muito usada é “vi com os meus próprios olhos”. Mas com que olhos enxergamos? Será que os nossos olhos são tão isentos assim?
Inicialmente, quando observamos uma pessoa, um objeto ou acontecimento, não o fazemos apenas com os olhos. Outros sentidos podem interferir em nossa percepção, a partir do que ouvimos, cheiramos ou tocamos. Somos seres sensoriais.
Passada esta etapa, o que estamos observando enfrentará filtros até se formar em nossa mente. Podemos fazer uso de generalizações, minimizações e distorções de vários tipos, a partir de nossas crenças, valores, pré-julgamentos, traumas e experiências anteriores.
Tal estímulo visual ainda precisará competir para ocupar um dos 14 bits que o cérebro é capaz de processar por segundo, ficando todo o resto no que podemos chamar de ponto cego. Para percebermos algo de um jeito ou de outro, ainda influenciará o nosso estado de ânimo do momento, em que o mesmo fato poderá nos irritar ou nos fazer sorrir. Isto sem falar no nosso estado fisiológico, de força, fraqueza, saúde ou doença.
É fácil enxergar defeitos em alguém de que não gostamos. Também é fácil achar que os nossos filhos ou netos são os mais lindos, mais inteligentes e mais especiais do que qualquer criança. Dizemos: “não é por ser minha neta não, mas ela não é mesmo especial?” A rejeição e o amor não estão no outro, mas dentro de nós.
Há pessoas que enxergam o mundo cinza e percebem defeitos em todos e em tudo. Para estas pessoas, há perigos em toda a parte e a tendência é sempre piorar. É um mundo de escassez, em que para alguém conquistar algo, alguém precisará perder. O outro pode ser uma ameaça e é potencialmente um inimigo. Poucos seriam confiáveis, porque “farinha pouca, meu pirão primeiro”. O egoísmo é apenas uma forma de autodefesa e o sistema neurológico predominante é o límbico, o de correr ou lutar. Para elas, problemas surgem para nos derrubar. Elas não são más pessoas, mas reagem ao mundo que veem. No entanto, o que estas pessoas veem não está fora, está dentro delas. O seu modelo mental cria esta realidade.
Não é preciso ser “Polyanna” para desenvolver um outro tipo de modelo mental e criar uma realidade igualmente verdadeira, mas muito mais construtiva. Há bastante o que agradecer em qualquer vida, por mais difícil que seja. O universo nos propicia muita coisa e nem é preciso falar sobre isto, de tão óbvio. As dificuldades podem ser vistas como fortalecedoras e impulsionadoras para novos caminhos. Quem comanda é o córtex frontal. Nesta visão, o mundo é um lugar de fartura e não precisamos que ninguém perca para nos beneficiarmos. Há espaço para a espiritualidade e emoções positivas. Estas pessoas também reagem ao mundo que veem. E o que elas veem não está fora, está dentro delas. O seu modelo mental cria esta realidade.
O Rei Gransábio I descobriu um segredo importante. O que vemos nos outros e à nossa volta está dentro de nós e não fora. Nosso modelo mental determina como vamos tratar o mundo e como o mundo vai nos tratar. Vale para reis. Vale para nós, pobres mortais. Afinal, não vemos com os olhos, mas com a mente.
Julio Sampaio (PCC, ICF)
Mentor do MCI – Mentoring Coaching Institute
Diretor da Resultado Consultoria Empresarial