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Estamos no mesmo barco ou somos um único barco?

Autor: Julio Sampaio

          Alguns de nós não conseguimos achar normais as imagens das festas clandestinas de fim de ano. O que se vê são centenas de pessoas sem máscaras, agarradas umas às outras, balançando os corpos seminus ao som de barulhos parecidos com música. Tudo isso poderia ser normal, se não tivéssemos ao fundo o número superior de 200.000 mortos até agora e pelo fato de não sermos uma ilha isolada do tipo: “o que eu faço com o meu corpo é problema meu”. Este discurso pseudoliberal é, na verdade, uma declaração de algo muito mais forte em nossa cultura: o egocentrismo.

Grande parte das pessoas, nestas festas clandestinas, está abaixo dos 60 anos, idade mínima de mais de 70% dos que morreram. Quem está lá, na sua maioria, são os jovens “inocentes” e “livres” que voltarão para casa. Alguns deles matarão os seus pais, ou avós. Alguns, sem sintomas, mas com o vírus, transitarão livres e contaminarão muito mais gente, sem deixar qualquer pista que os responsabilizem. Tudo em nome da liberdade e da felicidade. Mas felicidade é o oposto disso.

Diz a psicologia que momentos prazerosos são sim um tipo de felicidade (apenas um dos tipos). Mas há um princípio universal que é muito mais determinante. Não se colhe o que não se planta e a natureza nos ensina isso a partir de qualquer tipo de semente, seja de feijão, soja ou qualquer outra. A felicidade de caráter mais permanente e mais gratificante só dará frutos, se for plantada. Ou seja, é preciso plantar felicidade. O egoísmo e o egocentrismo, passados alguns poucos instantes, trarão a ressaca e o desprazer de um outro tipo de colheita. O arrependimento, a justificativa ou o cinismo não amortizarão a responsabilidade.

O escândalo das festas clandestinas nos lembra o quanto somos egoístas, como sociedade. Esta é a verdade. O vírus não mudou isto. Na pandemia presenciamos emocionantes sinais de solidariedade, especialmente, dos que estiveram na linha de frente. Parecia que sairíamos melhor deste ciclo, como seres humanos, mas o lado da sombra também estava lá.

Talvez seja mesmo um processo de avanços e recuos. Mas no que acreditamos? Sairemos desta mais altruístas e solidários? Vale o risco de passarmos por ingênuos e crédulos, de acreditar que sim? Ou é melhor a segurança do ceticismo do não? Quem não acredita nem tenta coisas que os crédulos acabam por conseguir.

Charles Eisenstein, em seu belo livro O mundo mais bonito que nossos corações sabem ser possível, defende que a compreensão de que estamos todos conectados é insuficiente. Segundo ele, ainda vivemos o que ele chama de História da Separação, que está nas nossas crenças mais profundas. Somos separados e devemos brigar pelos nossos interesses, sempre em primeiro lugar. A cultura da “farinha pouca, meu pirão primeiro”.

De acordo com Eisenstein, somente uma forte ruptura nos levará para o que ele denomina de História do Interser, ou da Interexistência. Nela, somos todos um único todo. Eu somente serei livre e feliz se você e todos os seres também o forem.

 A ideia parece utopia, absurda, tão distante que é de nossa realidade. Mas as rupturas são assim mesmo. Parecem irreais quando surgem, começam por parecer ridículas, mas daqui e dali, vão ganhado corpo, até serem capazes de destruir o que já não serve, mas que sempre encontra os que a ela estão agarrados, até “o último soldado”.

No que acreditamos? Nossas crenças definem as nossas escolhas e as nossas bandeiras. Acabam por se tornar profecias autorrealizáveis que se propagam. Ao invés do egoísmo, do prazer imediato e da separação, seremos capazes de assumir a bandeira do Plantar Felicidade e a da consciência de que não estamos apenas no mesmo barco? De que somos um mesmo barco?

 Que 2021 nos ajude a ser um barco mais consciente, que saiba o que nos fará felizes e para onde estamos indo.

 

Julio Sampaio

Mento-Coach e Fundador do MCI – Mentoring Coaching Institute

Diretor da Resultado Consultoria, Mentoring e Coaching

Autor do Livro: O Espírito do Dinheiro (Editora Ponto Vital), dentre outros