Marisa e Carlos acabaram de fazer um teste de assessment de perfil comportamental, patrocinado pela empresa em que trabalham. Ambos estão no mesmo departamento e ocupam cargos semelhantes. Na classificação de perfis, o teste não aponta o que é bom ou ruim, certo ou errado, mas características que podem ser mais adequadas para uma ou outra função ou situação. No todo, e pensando em uma equipe, pode-se considerar como positivo quando os perfis são complementares. Costumo lembrar que o teste, por mais validado que seja por estatísticas e por experts no assunto, será validado pela pessoa que o realiza, e não o contrário. Faz sentido para ela o que o teste está apontando? Ela se reconhece no relatório? Algum ponto a faz refletir e ter algum insight a partir daí?
O autoconhecimento é uma das forças que podemos desenvolver e está, com frequência, associado à inteligência emocional. “Conhece-te a ti mesmo” está escrito na entrada do templo Delfos e serviu de inspiração para a filosofia socrática. “Conhece-te a ti mesmo e conhecerás a verdade”. Para Sócrates, conhecer a si mesmo é base para uma vida equilibrada, para o melhor relacionamento com as pessoas e para uma vida mais feliz. Processos de coaching e de terapia transformadores costumam promover avanços expressivos no autoconhecimento.
Mas voltemos a Marisa e ao Carlos. Marisa não consegue esconder a sua alegria com o resultado do teste. É como se fosse um certificado de qualidades, com exceção de dois ou três pontos, que ela reconhece ter dificuldades. Vai se concentrar nestes pontos e “corrigir” o que acha que não está bom.
Diferente é a percepção de Carlos. Ele não gostou do teste, embora também se reconheça nele. Viu destacadas lacunas em competências que ele sabe agora que precisa focar para se desenvolver. Elas não lhe chamavam a atenção, mas olhando o relatório do assessment, elas parecem gritar o quanto ele precisa melhorar.
Analisando o relatório de um e de outro, eles nem são tão diferentes assim, a não ser pelo fato de Carlos possuir uma excessiva autocobrança que afeta a sua autoestima e o coloca sempre numa posição devedora. Carlos é do tipo que não se cansa de dizer que poderia ser melhor, mesmo quando os resultados são positivos. Seu nível de satisfação consigo mesmo e com a vida em geral não é elevado. O seu modelo mental influencia o seu nível de felicidade.
Mesmo não tendo o mesmo grau de autocobrança de Carlos, Marisa corre o risco de cair no mesmo tipo de armadilha. Ela se alegrou com o resultado, mas vai se concentrar no que não considerou bom. Age como o pai que recebe o boletim de escola do filho, com a maioria de notas azuis e que se concentra quase que exclusivamente nas notas vermelhas. Sim, é assim mesmo. É assim que a maior parte de nós reage. É assim também que a maioria das empresas se comporta. Deveria ser diferente?
Sim, deveria ser diferente. É o que defende Don Clifton, que criou o programa Descubram os Seus Pontos Fortes com uma equipe de cientistas do Instituto Gallup, com base em estudos em milhares de pessoas por mais de 40 anos. Sua conclusão é que, se ao invés de focarem nas suas deficiências, as pessoas se concentrarem nos seus pontos fortes, os resultados serão muito mais significativos. O que se faz é como, por exemplo, um técnico pegar um jogador como Neymar ou Cristiano Ronaldo e dizer: ao invés de fazer gols, onde vocês são craques, vamos focar o treinamento na marcação no meio de campo, onde vocês são apenas jogadores medianos.
Que tal para 2024, você, eu e muita gente nos concentrarmos nas nossas forças e talentos e não nas nossas deficiências? Além de obter melhores resultados, talvez sejamos ainda mais felizes.
Julio Sampaio (PCC, ICF)
Mentor do MCI – Mentoring Coaching Institute
Diretor da Resultado Consultoria Empresarial