Norberto estava na casa dos 50 e poucos anos e acabara de perder o emprego. A empresa onde trabalhara, por cerca de 15 anos, como vendedor, passava por uma crise e teve que fazer um corte drástico no quadro de pessoal. Por ser um dos maiores salários, Norberto não teve como escapar, mesmo tendo um alto conceito com os donos da empresa, eles mesmos lutando pela sobrevivência. Era o início dos anos 90 e ter mais de 50 anos significava ter mais idade do que hoje representa. A discriminação por pessoas mais velhas não era disfarçada e boa parte das empresas tinha políticas claras na restrição de contratação por idade. Para Norberto, que não tinha muitas reservas financeiras, o contexto não era promissor. A favor, havia a sua boa reputação e a maneira positiva de enxergar os desafios. 

Ele precisava agir rápido. Dentro de si, misturavam-se sentimentos de preocupação e o de confiança de que ele conseguiria uma situação ainda melhor do que tinha anteriormente. Norberto, como dito, cultivava sempre um olhar positivo diante das dificuldades. Sua religião o ajudava a manter tal atitude. Norberto estava mais do que nunca atento às oportunidades que apareceriam.

A chance que encontrou não parecia ser muito atrativa. Ao contrário, soava mais como uma proposta indecorosa, destas que não se faz a ninguém. Isto é o que pareceria aos olhos de muitos, mas não aos de Norberto, que a agarrou com “unhas e dentes”. Foi trazida por um amigo que era gerente comercial de um grande jornal, um setor que vivia um momento de expansão e profissionalização.

_ Olha, Norberto, disse ele. Eu penso que existe uma boa oportunidade no mercado para prospecção de novos clientes que não são atendidos por agências de publicidade e que poderiam ser anunciantes do jornal. Não tenho como contratá-lo, primeiro porque não há uma vaga aprovada no orçamento. Segundo que, pela política da empresa, não é possível contratar alguém da sua idade para um cargo de contato de publicidade. Terceiro, porque você é meu amigo e eu não posso misturar as coisas. 

O amigo seguiu apresentando a ideia.

_Se você quiser atuar como um corretor autônomo para prospectar novos clientes, posso providenciar o seu cadastro e treinamento. Mas há algumas condições para que dê certo, caso contrário, o projeto ficará no meio do caminho e teremos jogado nosso tempo fora.

Finalmente, veio a tal parte do que poderia ser interpretada como uma “proposta indecorosa”:

_ Você precisará se dedicar exclusivamente, marcando e fazendo visitas. Precisará chegar cedo e ir até o final do dia. Pela nossa estatística, você receberá 20 nãos até receber um sim. Terá que fazer relatórios semanais, cumprir metas, participar das reuniões diárias e ser tratado como se fosse um empregado do jornal. Você terá obrigações e nenhum direito trabalhista. Você não terá um salário fixo e nem ajuda de custo, mas uma boa comissão, como se fosse uma agência de propaganda. Tudo sem nenhum envolvimento do RH da empresa ou qualquer outra formalização. Você precisará ter em mente que não será contratado. Você topa?

Norberto disse sim, contrariando o que muitos chamariam de bom senso e se tornou o primeiro contato de publicidade do que ficou conhecido na empresa, ironicamente, como “projeto caça-fantasmas”, em alusão a um filme da época e o fato de ir em busca de clientes que não se enxergava no mercado publicitário. 

O trabalho de Norberto deu tão certo que, depois de um tempo, foi incorporado mais um profissional, depois um segundo e até um terceiro.  Norberto virou o professor de cada um que chegava, sem qualquer interesse, apenas pelo prazer de ser útil. Todos acabavam sendo contratados, menos Norberto, agora ainda com mais idade. Ele era remunerado como nunca fora antes, era querido pelos clientes, pela equipe, pelas outras áreas do jornal e até pelos funcionários do RH que agora defendiam a contratação de Norberto, mesmo contra a política da empresa, por uma questão de justiça.

O movimento ganhou força, sendo o tal gerente, amigo de Norberto, conduzido a fazer, por aclamação, o que não poderia executar por vontade própria. Todos comemoram a sua contratação como uma conquista própria.  Norberto, ao se aposentar alguns anos depois, criou a própria agência de publicidade, onde atuou até o final da vida. Seu filho seguiu os seus passos e hoje dirige uma agência com presença internacional.

Norberto, o mais bem-sucedido caça-fantasmas, já passava dos 50, quando transformou uma situação de desemprego em uma oportunidade de construir o seu legado, com resiliência, positividade e altruísmo. Para nossa reflexão: como a história de Norberto pode ser útil para lidarmos com os nossos desafios atuais?