Em um de nossos cursos no MCI, propomos um exercício para a turma: “Como você conta a sua história aos 90 anos?”. Eles têm alguns dias para refletir, escrever e depois compartilhar com a turma, sendo um aluno por aula. São sempre momentos emocionantes, não apenas para quem relata, mas para todos que ouvem. Cada história é rica e única. Todas trazem aprendizados. 

Não fomos nós que inventamos o exercício. Copiei do curso Escrita Criativa de minha esposa Cláudia que, fazendo uso do nome do curso, cria maneiras diferenciadas de estimular a criatividade dos alunos. 

Ao trazer para o MCI, os objetivos são outros.  Inicialmente, a prática estimula a pessoa a refletir sobre a própria vida, passando por coisas que ela nem lembrava mais. Em seguida, há a maneira como ela conta esta história, sendo uma ótima oportunidade para ressignificar acontecimentos como, por exemplo, aquela perda dolorosa que depois se transformou em algo positivo, nem que seja pelo aprendizado.

Ao olhar a trajetória, é possível ainda perceber as sincronicidades e, frequentemente, uma lógica na história, como se fosse um roteiro, escrito por nós mesmos e pela vida, uma força invisível e misteriosa. Também nos induz a olhar para o futuro, para o que ainda está por vir. Uma boa parte de nós, talvez não chegue aos 90 anos, mas somos provocados a pensar sobre a trajetória que falta até chegar lá. 

Para os que estão próximos ou além da metade da vida (é o caso normalmente dos nossos alunos), o que desejam ainda realizar até os 90? Que relacionamentos devem ser cultivados? Como pretendem chegar em termos de saúde física e como cuidar disso? O que, como pessoas, ainda precisam se desenvolver? O que já evoluíram até aqui e o que falta e que pode ser atingido?

Na medida em que a idade avança, vai ficando mais difícil sonhar. Não apenas ficamos mais “realistas”, como sentimos que o tempo que resta é mais reduzido, sem sabermos exatamente qual. Pode se encerrar a qualquer momento. Muitos se colocam na condição de espera e não como agentes ativos do próprio destino. Não nos é ensinado que, ainda que na mesma missão, precisamos rever o propósito continuamente, adequando-o ao nosso momento de vida. Alguém aos 50, 60, 70, 80, 90 ou mais, precisará sempre desenvolver um propósito. Caso contrário, estará aguardando o quê? 

Ao assumirmos, hipoteticamente, que chegaremos aos 90, somos provocados a retomar o volante de um trajeto que ainda poderá ser muito rico, seja externa ou internamente. Para finalizar, há o momento do compartilhamento, em que a pessoa traz o exercício do nível do pensamento e da escrita, para a palavra pública, reforçando as reflexões, intenções e compromissos. Há algo mágico quando este ciclo é completado, favorecendo a sua materialização.

Vi tudo isto acontecer muitas vezes com os nossos alunos, mas eu mesmo não o havia vivenciado. Aproveitei um gentil convite para compartilhar com um grupo a minha trajetória, para ir além e fazer este exercício, agregando os anos que ainda me faltam para chegar aos 90. Por uma destas felizes sincronicidades, encontrei na véspera, Jurema, uma amiga que não via há muitos anos.  Ela está há poucos meses de completar 90 anos.

Jurema está lúcida, saudável, tem uma vida independente e realiza trabalhos voluntários diariamente, sendo este o seu propósito. Com todas as dificuldades que enfrentou, sente que se saiu bem no cumprimento de sua missão. Seus filhos e netos seguem os seus próprios caminhos. Ela é uma pessoa Feliz. É feliz, destaco, do verbo ser. 

Jurema chegou mesmo aos 90. E você? Como você conta a sua história aos 90 anos?